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    Outras intersecções entre o crime e a direita

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    Sem querer querendo, o crime organizado e os partidos conservadores, de direita e extrema-direita, caminham abraçados com pautas em comum. O caso mais recente foi a campanha contra o Pix liderada pelo deputado Nikolas Ferreira (PL-MG). As fake news obrigaram o governo a recuar de normas de fiscalização contra as fintechs. Essa decisão beneficiou os investimentos do PCC ao adiar o controle das autoridades. Mas há outras intersecções entre o crime e os conservadores.

    Minha arma, minha vida. Povo armado jamais será escravizado, repetiu incansavelmente o ex-presidente Jair Bolsonaro. No Legislativo, a bancada da bala é uma das maiores do Congresso, com cerca de 240 integrantes, com seus expoentes do Partido Liberal. Segundo levantamento do Sou da Paz, 44 parlamentares eleitos em 2022 tiveram formação como policiais, bombeiros ou militares.

    Investigações da Polícia Federal apontam que ao ampliar o acesso de armas aos CACs (colecionadores, atiradores e caçadores) o governo Bolsonaro incentivou desvios, a criação de falsos clubes de tiro e o comércio paralelo. Segundo o portal G1, com base em dados do Exército, foram 904.858 novos registros de armas para CACs entre 2019 e 2022 — o que equivale a uma média de 26 novas armas por hora. De janeiro a outubro de 2023, registrou-se uma média de 126 desvios por mês – cerca de quatro por dia. No Estado de São Paulo, um relatório do TCU aponta que 8% das armas apreendidas em crimes estavam registradas em nome de CACs, sendo 1.312 delas adquiridas a partir de 2019. Sem querer querendo, a direita armou o crime.

    A bancada da bala é representante de uma política de segurança que oprime periferias, assassina  jovens negros, mata policiais e superlota presídios, alimentando a mão de obra do crime organizado, com alta proporção de presos provisórios e ausência de políticas de ressocialização. O PCC surgiu onde? Os presídios funcionam como centros de comando, recrutamento, formação e expansão das redes criminosas. Sem querer querendo,  a direita aumenta o número de integrantes das facções criminosas.

    Nossos biomas são outro cenário dessa união informal. Mandato após mandato, parlamentares avançam sobre a natureza com a flexibilização das leis ambientais. Mesmo com vetos de Lula, o PL da Devastação permite simplificar e acelerar a autorização de empreendimentos considerados “estratégicos” pelo governo.

    Com essas iniciativas, as bancadas da mineração e do agro, com maioria absoluta de parlamentares conservadores,  incentivam a  grilagem de terras e mineração em áreas indígenas — muitas vezes com proteção armada de facções. Estudo do Ipea do ano passado denuncia o consórcio entre facções e garimpo em terras yanomamis, apontando necessidade de ajuste legal e reforço fiscalizatório.

    Há ligações mais evidentes, por exemplo, entre milícias e políticos de direita no Rio de Janeiro. Curioso lembrar que a família Bolsonaro tem um passado garimpeiro e já condecorou milicianos. Até que a Justiça prove o contrário, o crime e os políticos conservadores seguem trilhas paralelas, mas com objetivos em comum.