Guerreira, valente e regente dos ventos, raios e tempestades. Esta é Iansã, divindade de religiões de matriz africana também conhecida como Oiá (ou Oyá, em iorubá). A orixá foi retratada em desenho por uma menina de quatro anos de idade em uma atividade na Escola Municipal de Ensino Infantil (Emei) Antônio Bento, no Caxingui, zona oeste de São Paulo. O caso virou polêmica e envolveu até policias armados.
Após ter conhecimento do desenho, feito em atividade que integra o currículo antirracista da Secretaria Municipal da Educação (SME), o pai da menina entrou na escola e rasgou um mural com as produções dos alunos, que têm entre quatro e seis anos de idade, conforme o relato de testemunhas à reportagem. No dia seguinte, ele acionou a Polícia Militar (PM) contra a escola. O homem é soldado da corporação.
A história foi revelada pelo Metrópoles e, após repercussão, causou efeitos práticos no poder público. A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que apura a conduta dos PMs, que entraram fortemente armados na instituição e teriam intimidado crianças e funcionários. A Prefeitura de São Paulo também cobra a ouvidoria da PM sobre o caso.



Desenhos que alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, fizeram em atividade sobre religiões de matriz africana
Material cedido ao Metrópoles
Desenho da orixá Iansã que motivou pai de aluna de escola infantil de São Paulo a chamar a polícia
Material cedido ao Metrópoles
Desenhos de alunos do EMEI Antônio Bento, em São Paulo, em atividade intitulada “Ciranda de Aruanda”
Material cedido ao Metrópoles
Capa do livro “Ciranda em Aruanda”, de Liu Olivina, publicado pela Editora Quatro Cantos
Reprodução/Liu Olivina/Editora Quatro Cantos
No livro, a autora traz desenhos e informações sobre dez orixás
Reprodução/Liu Olivina/Editora Quatro Cantos
Liu Olivina, autora de livro que inspirou atividade denunciada à PM
Acervo Pessoal
Ligação da orixá com crianças
Esses efeitos se associam diretamente à mitologia que cerca Iansã, que é descrita como poderosa, ousada e altiva – e é mãe de nove crianças, conforme conta um mito da orixá.
A história relata que Oiá queria muito ter filhos, mas não conseguia. Após um sacrifício, ela se tornou mãe nove vezes e, desde então, carrega nove colheres, representando a prole.
“Ela [aluna de quatro anos] se espelhou em uma dessas nove crianças para desenhar Iansã”, diz mãe Kátia Luciana Sampaio, Mam’etu Kutala Diamuganga, filha da orixá e sacerdote do terreiro de candomblé Abassá Oxum e Oxóssi, na zona leste de São Paulo.
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Pai acionou a PM após filha de 4 anos desenhar orixá
O pai de uma aluna da Escola Municipal de Ensino Infantil (Emei) Antônio Bento, no Caxingui, zona oeste de São Paulo, acionou a PM após descobrir que a filha de 4 anos fez um desenho da orixá Iansã em uma atividade no colégio. O caso aconteceu na tarde da última quarta-feira (12/11).
Depois do episódio, a direção do colégio indicou que o homem participasse, na quarta-feira, da reunião do Conselho da Escola, prevista para acontecer às 15h. Ele não compareceu ao encontro, mas acionou a PM.
Os PMs permaneceram dentro da Emei por pouco mais de uma hora. A abordagem foi considerada hostil por testemunhas. A supervisora de ensino foi acionada e também compareceu ao local.
Aos agentes, a direção da Emei citou as leis nº 10.639/03 e nº 11.645/08, que tornam obrigatório em todo o território nacional o ensino de história e cultura afro-brasileira, e explicou que a atividade não tinha caráter doutrinário. As crianças teriam apenas ouvido a história do livro e fizeram um desenho na sequência.
Em nota, a SSP afirmou que, ao atender à ocorrência, os policiais conversaram com as partes – pai e diretora da instituição de ensino.
“Ambos foram orientados a registrar boletim de ocorrência, caso julgassem necessário. A Corregedoria da PM está à disposição para apurar eventuais denúncias sobre a conduta policial”, disse a pasta.
A SSP acrescentou, ainda, que o uso do armamento, que inclui metralhadora, faz parte do Equipamento de Proteção Individual (EPI) dos policiais e é portado durante todo o turno de serviço.
Já a Prefeitura de São Paulo, por meio da SME, informou que o pai da estudante recebeu esclarecimentos de que o trabalho apresentado por sua filha integra uma produção coletiva do grupo.
“A atividade faz parte de propostas pedagógicas da escola, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena dentro do Currículo da Cidade de São Paulo”, reforçou a gestão municipal.





