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    Secretário sobre combate a facções no DF: “Força entra em todo lugar”

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    Enquanto diversos estados convivem com disputas territoriais e o avanço de facções criminosas, o Distrito Federal mantém um cenário considerado mais controlado – sem áreas dominadas por organizações do crime. Para o secretário da Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), Sandro Avelar, “não existe um milímetro do Distrito Federal onde as forças do estado não possam entrar”.

    Em entrevista ao Metrópoles, Avelar credita o resultado à integração entre as forças de segurança da capital – as polícias Civil (PCDF), Militar (PMDF) e Penal do DF (PPDF) -, fator que especialistas em segurança pública já haviam destacado e ressaltado ser o diferencial do controle das facções na capital. Mas até que ponto essa cultura de integração é capaz de impedir o avanço territorial das facções no DF?

    Apesar da não dominação territorial na capital, Brasília não deixa de ter a presença de facções. Desde 2019, o DF passou a receber líderes faccionados, considerados de altíssima periculosidade, que foram confinados na Penitenciária Federal de Brasília, como o caso de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, identificado como número 1 do PCC. A presença dos líderes criminosos acaba por atrair membros das organizações à capital.

    Células de inteligência

    Para o secretário, uma das ações que auxilia no controle da expansão das facções é a “célula integrada de inteligência”, que consiste na troca de informações entre as corporações. O serviço, inclusive, foi colocado à disposição pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) às forças militares do Rio de Janeiro após a megaoperação, a fim de auxiliar no prosseguimento das investigações.

    “Nós estamos acostumados a trabalhar com outras forças, como as do governo federal e de outros estados. A gente capitaneia e coordena esse processo no sentido de buscar fazer com que a gente tenha essa cultura de trabalhar junto”, destacou o secretário.

    Ele ressalta que o trabalho de prevenção vai além do processo investigativo ao continuar acompanhando o monitoramento dos criminosos dentro dos presídios.

    Em um último dado fornecido pela Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape-DF), no primeiro semestre deste ano, integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV) e Comboio do Cão (CDC) somavam cerca de 480 detentos – 200 do PCC, 80 do CV e 200 do CDC – dos mais de 15 mil detentos das penitenciárias da capital.

    O controle penitenciário, segundo Sandro, impede o “comando” e a “troca de informações” com aqueles que estão dentro do presídio com os que estão fora, seguindo as ordens, além de garantir o avanço territoriais das facções.

    “O que tem nos diferenciado é isso. É essa capacidade que a gente tem tido de trocar informações e o grande número de informações que vem sendo gerado até de dentro dos presídios”, explicou.

    Em nota, a Seape-DF reforçou que o trabalho integrado com as outras forças de segurança envolve o “rastreamento de bilhetes apreendidos em celas ou com visitantes, a análise de comunicações internas e a interceptação de cartas que contenham estatutos ou diretrizes de organizações criminosas”.

    “Esses elementos permitem identificar o grau de envolvimento de cada interno, distinguindo os integrantes comuns das lideranças com poder de influência. Os líderes identificados são isolados da massa carcerária, em celas específicas, de forma a impedir a articulação e o comando de atividades criminosas a partir do sistema prisional”, completou em nota.

    Integração Nacional

    Levando em consideração a lista de mortos na megaoperação no Rio de Janeiro, nota-se o nome de criminosos e até mesmo de líderes de outras facções de diferentes localidades do país. O balanço total constatou que 62 mortos eram oriundos de outros estados, incluindo o Distrito Federal.

    Para o secretário, o cenário atual da cultura de integração do DF, caso fosse estendido aos outros estados, poderia impedir que esses deslocamentos ocorressem através do monitoramento compartilhado entre as corporações dos estados.

    Um exemplo é a relação bilateral entre o DF e Goiás, que não só auxilia no combate ao crime no Entorno do DF, mas também a proliferação das facções nas duas unidades da Federação.

    “Nós temos acordos que nos permitem atuar do lado de lá [GO] e permite também que eles aturem do do lado de cá [DF] de forma partilhada. Não é incomum isso acontecer”, disse.

    O secretário destaca que essas relações tendem a estender aos outros estados por meio do Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública (CONSESP), do qual o titular da pasta é presidente.

    Segundo Sandro, os 27 secretários estaduais têm atuado de forma suprapartidária, com decisões técnicas e consensuais, como deliberação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, que fortalece a Polícia Federal, em que, de forma unânime, todos voltaram por uma proposta alternativa a fim de garantir a autonomia das forças de segurança do Brasil.

    Essa “ideia de parceria”, segundo o secretário, é o que moveria a segurança pública do país. Mas, para isso acontecer, seria necessário a “capacidade de coordenação do governo federal” para garantir uma integração nacional das forças de segurança.

    “Isso não se faz de cima para baixo. Isso só se faz com um grande processo de construção nas bases e de conversa, com liderança, com auxílio financeiro. Esse é o papel que o governo federal tem que executar. Segurança pública você não resolve com uma tacada”, destacou.

    Governo federal

    Uma das medidas ressaltadas pelo secretário para que essa coordenação seja feita é a criação de um ministério próprio de Segurança Pública, desvinculado do Ministério da Justiça. A adoção seria voltada para que políticas específicas sejam coordenadas por técnicos da área em vez de um tutelado do órgão.

    “Ambas as pastas têm fundamental importância para o país. Tanto a Justiça quanto a segurança pública são fundamentais. Mas elas têm que ser tratadas por profissionais de cada uma das áreas. É  preciso que haja essa visão mais realista para que possamos realmente caminhar e buscar esse trabalho de coordenação por parte do governo federal”, explicou.

    Ele destaca também a necessidade do “reconhecimento” da destinação de uma “fonte de financiamento para a segurança publica”. Para o secretário, no mesmo Fundo Constitucional que prevê receitas da União para a saúde e educação do DF, deverá ser reservado para a pasta.

    Assim como ações estruturais que visam o enfrentamento da criminalidade a médio e longo prazo, como investimentos na educação, infraestrutura urbana e geração de emprego. Segundo o estudo “Caracterização da atuação das facções prisionais-criminais na região Centro-Oeste” do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), um dos fatores que influencia a chegada as facções no DF se dá em razão da “segregação urbana das classes mais pobres”.

    “Ela [segurança pública] é a base de tudo e tem de ser melhorada com investimento em outras áreas, cujo resultado vai fazer com que a gente tenha menos criminalidade”, finalizou o secretario.