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    CPI dos Atos Golpistas: relatora pede indiciamento de Bolsonaro, Torres, Cid, Braga Netto e militares

    Por G1

    Além do próprio ex-presidente, lista inclui ex-auxiliares dele e ex-comandantes do Exército e da Marinha. Senadora Eliziane Gama (PSD-MA) leu parecer nesta terça; votação deve ficar para quarta (18).

    A relatora da CPI dos Atos Golpistas, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), pede em seu relatório o indiciamento de 61 pessoas, entre civis e militares. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e parte do núcleo de governo dele — cinco ex-ministros e seis ex-auxiliares — estão na lista.

    O relatório final, protocolado no sistema do Senado, foi apresentado na manhã desta terça-feira (17) ao colegiado. A votação, no entanto, deve ocorrer somente na quarta (18).

    Além de focar no entorno de Bolsonaro, o documento confirma o apelo de parlamentares da base aliada ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pede o indiciamento de militares das Forças Armadas, como os ex-comandantes da Marinha, Almir Garnier Santos, e do Exército, Marco Antônio Freire Gomes.

    Também estão no rol integrantes da Polícia Militar do Distrito Federal, responsável pela segurança da Esplanada dos Ministérios (veja a lista completa abaixo).

    Senadora Eliziane Gama, relatora da CPI dos Atos Golpistas, apresenta relatório da comissão — Foto: TV Senado/Reprodução

    Os pedidos feitos por Eliziane no parecer não significam indiciamentos automáticos. A lista é, na prática, uma sugestão. Cabe aos órgãos responsáveis, como o Ministério Público, avaliar a apresentação de denúncias.

    Os indiciados

    O parecer da senadora sugere indiciamentos por 26 delitos diferentes. Os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de depor governo legítimo são os mais frequentes.

    No total, os dois tipos penais foram atribuídos a 46 pessoas.

    São indiciados pela relatora no documento:

    • ex-presidente Jair Bolsonaro
    • general Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro e ex-ministro da Casa Civil e da Defesa
    • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e então secretário de Segurança Pública do DF nos atos
    • general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional de Bolsonaro
    • general Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro
    • general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa de Bolsonaro
    • almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha
    • general Freire Gomes, ex-comandante do Exército
    • tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens e principal assessor de Bolsonaro
    • Filipe Martins, assessor-especial para Assuntos Internacionais de Bolsonaro
    • deputada federal Carla Zambelli (PL-SP)
    • coronel Marcelo Costa Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
    • general Ridauto Lúcio Fernandes
    • sargento Luis Marcos dos Reis, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
    • major Ailton Gonçalves Moraes Barros
    • coronel Elcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde
    • coronel Jean Lawand Júnior
    • Marília Ferreira de Alencar, ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça e ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF
    • Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal
    • general Carlos José Penteado, ex-secretário-executivo do GSI
    • general Carlos Feitosa Rodrigues, ex-chefe da Secretaria de Coordenação e Segurança Presidencial do GSI
    • coronel Wanderli Baptista da Silva Junior, ex-diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI
    • coronel André Luiz Furtado Garcia, ex-coordenador-geral de Segurança de Instalações do GSI
    • tenente-coronel Alex Marcos Barbosa Santos, ex-coordenador-adjunto da Coordenação Geral de Segurança de Instalações do GSI
    • capitão José Eduardo Natale, ex-integrante da Coordenadoria de Segurança de Instalações do GSI
    • sargento Laércio da Costa Júnior, ex-encarregado de segurança de instalações do GSI
    • coronel Alexandre Santos de Amorim, ex-coordenador-geral de Análise de Risco do GSI
    • tenente-coronel Jader Silva Santos, ex-subchefe da Coordenadoria de Análise de Risco do GSI
    • coronel Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da PMDF
    • coronel Klepter Rosa Gonçalves, subcomandante da PMDF
    • coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante do Departamento de Operações da PMDF
    • coronel Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, comandante em exercício do Departamento de Operações da PMDF
    • coronel Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, comandante do 1º CPR da PMDF
    • major Flávio Silvestre de Alencar, comandante em exercício do 6º Batalhão da PMDF
    • major Rafael Pereira Martins, chefe de um dos destacamentos do BPChoque da PMDF
    • Alexandre Carlos de Souza, policial rodoviário federal
    • Marcelo de Ávila, policial rodoviário federal
    • Maurício Junot, empresário
    • Adauto Lúcio de Mesquita, financiador
    • Joveci Xavier de Andrade, financiador
    • Meyer Nigri, empresário
    • Ricardo Pereira Cunha, financiador
    • Mauriro Soares de Jesus, financiador
    • Enric Juvenal da Costa Laureano, financiador
    • Antônio Galvan, financiador
    • Jeferson da Rocha, financiador
    • Vitor Geraldo Gaiardo , financiador
    • Humberto Falcão, financiador
    • Luciano Jayme Guimarães, financiador
    • José Alipio Fernandes da Silveira, financiador
    • Valdir Edemar Fries, financiador
    • Júlio Augusto Gomes Nunes, financiador
    • Joel Ragagnin, influenciador
    • Lucas Costar Beber, financiador
    • Alan Juliani, financiador
    • George Washington de Oliveira Sousa, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
    • Alan Diego dos Santos, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
    • Wellington Macedo de Souza, condenado por envolvimento na tentativa de atentado ao aeroporto de Brasília
    • Tércio Arnaud, ex-assessor especial de Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”
    • Fernando Nascimento Pessoa, assessor de Flávio Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”
    • José Matheus Sales Gomes, ex-assessor especial de Bolsonaro apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”

    Justificativas

    No início da leitura do documento, a senadora rechaçou a ideia de que os atos de 8 de janeiro ocorreram de forma espontânea. Ela atribuiu o movimento golpista ao ambiente inflamado por Jair Bolsonaro e aliados.

    “Nosso objetivo foi entender como isso aconteceu; como alguns milhares de insurgentes se radicalizaram, se organizaram e puderam romper, sem muita dificuldade, os sistemas de segurança que deveriam proteger a Praça dos Três Poderes. As investigações aqui realizadas, os depoimentos colhidos, os documentos recebidos permitiram que chegássemos a um nome em evidência e a várias conclusões. O nome é Jair Messias Bolsonaro”, disse.

    “O 8 de janeiro é obra do que chamamos de bolsonarismo. Diferentemente do que defendem os bolsonaristas, o 8 de janeiro não foi um movimento espontâneo ou desorganizado; foi uma mobilização idealizada, planejada e preparada com antecedência. Os executores foram insuflados e arregimentados por instigadores que definiram de forma coordenada datas, percurso e estratégia de enfrentamento e ocupação dos espaços”, acrescentou.

    A relatora também atribui os atos golpistas a uma “omissão” do Exército.

    “O Oito de Janeiro é resultado da omissão do Exército em desmobilizar acampamentos ilegais que reivindicavam intervenção militar; da ambiguidade das manifestações e notas oficiais das Forças Armadas, que terminavam por encorajar os manifestantes, ao se recusarem a condenar explicitamente os atos que atentavam contra o Estado Democrático de Direito; e de ameaças veladas à independência dos Poderes”, diz.

    Eliziane Gama ainda avalia que o entorno de Bolsonaro sabia do “alcance” e, deliberadamente, estimulou manifestações de cunho golpista.

    “Jair Bolsonaro e todos os que o cercam sabiam disso [articulações golpistas]. Conheciam os propósitos e as iniciativas. Compreendiam a violência e o alcance das manifestações. Frequentavam os mesmos grupos nas redes sociais. Estimulavam e alimentavam a rebeldia e a insatisfação. Punham deliberadamente mais lenha na fogueira que eles mesmos haviam acendido.”

    No caso específico de Bolsonaro, a relatora pede indiciamento pelos seguintes crimes:

    • associação criminosa;
    • tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
    • golpe de Estado;
    • e emprego de medidas para impedir o livre exercício de direitos políticos.

    Próximos passos

    Para ser aprovado, o documento com mais de mil páginas precisará dos votos da maioria dos membros da CPI mista de deputados e senadores — o que deverá ocorrer, diante da predominância de aliados do Planalto no colegiado.

    O conteúdo do parecer aprovado é enviado a diversos órgãos que avaliam e decidem pela apresentação de denúncias baseadas nele. Entre as instituições para as quais o documento é encaminhado estão órgãos policiais, o Ministério Público e a Advocacia-Geral da União (AGU).

    Foco em militares

    O relatório apresentado por Eliziane Gama confirmou a estratégia apontada por governistas de responsabilizar militares das Forças Armadas e da Polícia Militar do DF.

    No documento, ela aponta que a “omissão de militares diante de movimentos de cunho golpista levaram aos ataques de 8 de janeiro. Ao todo, 29 militares — ativos ou na reserva — das Forças e da PMDF foram indiciados por Eliziane.

    Há destaque para o ex-comandante da Marinha almirante Almir Garnier Santos e para o ex-comandante do Exército general Freire Gomes.

    A senadora apontou que Garnier atuou “conjuntamente” com Bolsonaro e outros indivíduos “dolosamente” para o ato de 8 de janeiro.

    O ex-comandante da Marinha foi mencionado pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em delação premiada, sobre reuniões do ex-presidente para tramar um golpe de Estado.

    Eliziane afirma que, se confirmada a delação de Cid, Garnier deve ser indiciado pelos crimes de associação criminosa e de tentativas de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de governo legítimo.

    Em relação a Freire Gomes, Eliziane afirma que o então comandante do Exército deixou de atuar, de forma deliberada, para desmobilizar acampamentos golpistas em frente a unidades militares.

    “Deixara de praticar, indevidamente, ato de ofício, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, consubstanciado em evidente simpatia para com os manifestantes que estavam cometendo crimes militares, expressa diversas vezes inclusive em depoimento perante a esta CPMI”, disse.

    Linha do tempo

    O parecer de Eliziane amarra e relaciona os ataques de janeiro ao ambiente polarizado pós-derrota de Bolsonaro, em outubro de 2022.

    Entre outros pontos, a senadora fez menção aos seguintes casos:

    O documento também identifica tentativas de aliados de Bolsonaro para impedir a ida de eleitores às urnas no último ano.

    Há destaque ao ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques. Ele é apontado como responsável por direcionar número maior de efetivo para operação em rodovias do Nordeste, no segundo turno das eleições.

    A Silvinei foram atribuídos os crimes de associação criminosa e de impedir que pessoas pudessem votar no segundo turno das eleições, entre outros.

    Propostas legislativas

    O parecer apresentado por Eliziane também recomenda propostas legislativas ao Congresso.

    Entre os textos estão:

    • proposta que estabelece que presentes recebidos por presidente da República em mandato não podem configurar como acervo pessoal
    • proposta que cria o Dia Nacional de Defesa da Democracia, a ser comemorado em 25 de outubro

    A relatora da CPI dos Atos Golpistas encaminha, ainda, recomendações ao governo. Uma das propostas prevê que militares em cargos civis sejam julgados, por faltas disciplinares, nos órgãos aos quais estão vinculados, e não pelas instâncias militares.

    Além desses textos, Eliziane Gama apresentou — por conta própria — um projeto que cria, na área externa do Senado, um memorial em homenagem à democracia brasileira.

    A ideia é semelhante à adotada pela CPI da Covid do Senado, que propôs a criação de um memorial em homenagem às vítimas da Covid-19, no ambiente interno da Casa.